novembro 29, 2005

Novela dos dias que correm

Imagine uma cena no Chapitô num fim de tarde entre Abril e Agosto em que um casal, à primeira vista de estranhos, fita o Tejo sem falar. Imagine também que ela está em pulgas para o ouvir pedi-la em casamento e ele mortinho por sair daquela cena. Imagine ainda os seus diálogos cerebrais:
Ele, olhando-a com aquele ar de quem não percebe o que está ali a fazer: O que tu queres sei eu…
Ela, doida por ouvir o pedido: Estes sinais, a perna a tremer, a mão a segurar a cabeça… É hoje, não tenho dúvidas.
Ele, descruzando a perna e coçando o lábio: Tenho que me despachar a beber este whisky.

Já alto e bom som:
Ele: Desculpa, não aguento mais. Queria…
Ela: ...eu também não…mas diz, diz.
Ele: Queria que me ajudasses a organizar uma festa simples para o meu casamento.

Bomba. Acham que ela ajuda? Acham que ela não vai contar às amigas e às revistas todas que era ela a eleita, a mulher da sua vida, e que afinal ele vai casar com uma paixão antiga qualquer? Acham que ela não aparece no dia do casamento vestida de branco imaculado?

Agora pare, rebobine tudo e imagine um Primeiro-Ministro algo autoritário a falar com um poeta de Assembleia algo sonhador.

Agradecimento Sanex

Chegado o mês de Dezembro, começam a escassear bens de primeira necessidade nos Ministérios, como o material de economato ou o sabonete líquido para as mãos. Aproveita-se o papel reciclado, esquece-se a folha dupla, adopta-se o sabão azul e branco.
Este ano descobri a responsabilidade social das empresas e o sabonete líquido voltou. Agradecimento geral a quem merece, sobretudo pelo efeito surpresa.

novembro 25, 2005

“A ofensiva portuguesa contra o Reino Unido”

Até hoje me arrependo de não ter comprado uma t-shirt a dizer ‘Eu não leio Pacheco Pereira’ que há uns anos vendiam na Feira do livro. Ontem li Pacheco Pereira e não posso deixar de expressar a minha preocupação.

A saga já tem resposta e esta, passando alguns erros de datas, quase convence. Quem lá esteve, a 17 de Junho de 2005, sabe bem o que se passou e o que se passou desde então, e resta-nos concluir que o nosso Ministro não deixa de ter razão e que muito mais se podia dizer, incluindo sobre uma certa anglicização da acção externa da UE.
Pecou por ter lançado a ofensiva, naquele tom, nesta altura em que ainda resta alguma esperança sobre as perspectivas financeiras. Tê-lo-á feito não por ser um ‘europeísta extremo’, como lhe chama Pacheco Pereira, mas por duas razões bem mais simples. Por um lado, parece ter alguma dificuldade em perceber a diplomacia europeia actual, os seus timings, as suas negociatas. Por outro - e talvez seja este o argumento com maior peso - , já se apercebeu que uma das grandes prioridades da política externa nacional (‘sacar os fundos’) está seriamente comprometida pela atitude da Presidência britânica.
Dammage control ex ante.

Happy Birthday Mr. President

Ando há mais de uma semana a preparar este post e ainda não arranjei nada de positivo para dizer sobre o José Barroso (parecem-me ser os únicos elementos consensuais no nome de Durão Barroso pré e pós Comissão Europeia). Ao ver ontem aquele José cheio de si, do alto do seu Berlaymont, com o mesmo sorriso e o mesmo risinho histérico de outrora, a única coisa que se me oferece dizer é que, para bem da imagem do país, ele que continue a tentar, seja lá o que for. Nem que seja dizer superficialidades como ‘temos que aproveitar a globalização’ ou a pôr velinhas para o espírito europeu.

novembro 21, 2005

Todas as cartas de amor são ridículas

O cheiro a lareira traz o cacimbo, mas a distância inexistente impede o ‘gosto tudo de ti sempre até ao fim do mundo’. Não há momentos para o dizer boca a boca, enviar milhões e milhões de beijos, exigir lembranças.
A verbalização da distância, da saudade, do amor. Da guerra acho que também chegou a altura de falar e de ouvir e de escrever e de ler, mesmo e sobretudo envolto em cartas de amor ridículas.

Recomendo, sem saber bem porquê. Talvez para impedir que 'entremos tão depressa nessa noite escura’.

novembro 15, 2005

Anti-Público

Já lá vai o tempo em que éramos o jornal que líamos. Já não é assim, e por um lado ainda bem porque ao aumentar a nossa liberdade, aumenta o sentido crítico. Fiel ao Público durante muitos anos, desisto. A multiplicação de croniquetas ou a débil cobertura do internacional seriam as razões mais válidas para o fazer. Mas o que me faz desistir são as infindáveis gralhas, as trocas nos nomes, os títulos cortados.
Era bom que alguém percebesse que ler um jornal assim é como comer um prato onde vamos descobrindo a cada garfada cabelos e insectos vários.

Manifestamente Europa

Constatação quase unânime: a Europa voltou a morrer.
Raptada na Grécia Antiga, tem vindo a morrer século após século, sendo talvez as datas fatídicas que me ocorrem mais rapidamente 1 de Setembro de 1939, 5 de Março de 1946, 22 de Janeiro de 1972, 4 de Dezembro de 1999, 29 de Maio e 1 de Junho de 2005, 17 de Junho de 2005, 27 de Outubro de 2005.
Europa, uma história de mortes e adventos intermitentes. Morre todos os dias sob as penas afiadas dos jornalistas, nas mãos da dupla Blair-Barroso, no arame farpado de Ceuta e Melilla, nas cités de Paris. Matámos o modelo social europeu, matámos o grande desígnio europeu.
Ainda hoje a Europa morreu na fronteira de Rafah quando, após meses de contactos entre Europeus, Palestinianos e Israelitas, a Sra. Rice aparece e realiza o milagre que podia ter sido nosso. Não temos política interna, não temos política externa. Não temos Europa.
E, no entanto, a culpa é sempre da Europa, é a Europa que não consegue crescer, é a Europa que não consegue defender o seu modelo social, é a Europa que não consegue integrar os seus imigrantes, é a Europa que não se consegue afirmar face à hegemonia norte-americana. Está condenada.
E nós condenados estamos a tê-la cada vez mais viva na consciência de todos, mesmo daqueles que se insurgem contra ela.

novembro 10, 2005

Ao segundo dia...

...vi-te. Passaste por mim 3 vezes, estive na tua sala, toquei o teu sininho. Pareceste-me tão estrangeiro que não senti qualquer vontade de te abordar, nem com um simpático 'Keep up the great work, Mr. Barroso'.

Foto prometida para o regresso a Lisboa.

novembro 07, 2005

Prioridades chave-na-mão

Ouvi dizer que a integração europeia era uma prioridade da nossa política externa. Ouvi dizer que a nossa grande prioridade em termos europeus eram as perspectivas financeiras. Ouvi dizer que está hoje a decorrer em Bruxelas um Conselho de Assuntos Gerais e Relações Externas onde se discutem as perspectivas financeiras. Ouvi dizer que, como tem sido hábito, S. Exa. o Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros se escusou a fazer a viagem.
Se o senhor é Ministro, ainda por cima dos Estrangeiros e não gosta/não quer/não pode viajar, adeqúe-se o estatuto ao perfil e faça-se do ‘vá para fora cá dentro’ uma linha de força da nossa política externa. Não andem é a falar de política externa e de Europa e de referendos quando os exemplos ao mais alto nível já não deixam margem de dúvida sobre as prioridades.

novembro 04, 2005

Interferências

A Polícia Jidiciária de Moçambique? à Busca de um tabuleiro de xadrês? Na residência de Jorge Guebuza? Coelho? Em Cahora Bassa???

Edição RTP

novembro 03, 2005

Recordar é viver

Embora não vá fazer campanha (pergunto-me, aliás, por que aceitou ser capa da Flash), Maria Cavaco Silva tem o que falta a muitos Portugueses: memória. Tinha um ano quando perdeu a mãe e nunca mais esqueceu aquela dor que a tem acompanhado durante toda a vida.
Para Portugal, foram dez anos de recalcamentos gástricos, de miopia estratégica, de autismo intelectual, de cancro obstinado. Agora o alzheimer, em breve a depressão.