julho 19, 2005

Quando o mito se torna a minha realidade

Não tendo nenhum em casa, habituei-me a imaginar o Funcionário Público como um ser cinzento, parasita, desinteressado e desinteressante, cumpridor do horário das 10h às 17h. Desde há alguns anos, ele é-nos apresentado como a causa de todos os males da nossa sociedade e da nossa economia, como aquele que, do ensino à saúde, engorda o défice, destrói a produtividade e suga o Estado Providência.
As fontes do mal já foram identificadas: faltam incentivos, responsabilização, cultura de serviço público, etc.. Acima de tudo, falta confiança. Confiança por parte dos chefes, muitos deles funcionários públicos, confiança por parte das chamadas elites dirigentes, algumas delas também públicas. Criam-se administrações paralelas, gabinetes cada vez maiores, encomendam-se estudos a consultoras privadas e obtém-se uma duplicação desnecessária e dispendiosa da Administração Pública. Não faz falta uma reforma da Administração Pública, fazem falta várias reformas, faz falta um conceito de gestão de recursos humanos públicos adequado às necessidades da economia e da sociedade.
Se os políticos conseguem pôr a funcionar gabinetes, se as coisas se fazem sempre, com ou sem o auxílio dos funcionários públicos, por que não aplicar aos serviços uma lógica de gabinete no qual o funcionário sabe quais são as linhas de orientação, serve não um governo, mas o País, com toda a responsabilidade inerente ao cargo?
Processo longo, sinuoso, será com certeza, mas há que aproveitar o facto de muitos funcionários públicos já terem passado por experiências profissionais não públicas para tentar perceber por que razão rendem mais nesses cargos do que nos públicos.
Se um boy não rende num gabinete, percebo por que não se exonera o boy. Nos serviços também se mantém o parasita, com tudo o que vai custando a todos nós, não só em termos financeiros, mas também em esforço quotidiano para não nos tornarmos um. Acabaremos por ficar como ele por não ver a recompensa do trabalho ou por ir procurar um trabalho que nos estimule verdadeiramente.
Temo que em breve me encontrem a pescar jaquinzinhos e a apanhar lavagante ao largo do Algarve.
Foi o último post sobre estes temas. Daqui para a frente, só coisas bonitas, prometido.