setembro 07, 2005

SOS Solidariedade Social

A quem de direito
Cheguei ao Centro Distrital da Segurança Social eram quase 13h30 e dirigi-me à fila onde me dariam a senha que ditaria a minha espera. As duas pessoas que estavam à minha frente foram corridas assim que pronunciaram a palavra declaração: já não há senhas.
- Como 'já não há senhas' se o atendimento é até às 16h30?
- Já não há senhas desde as 10h30, minha senhora.
- Mas eu vou ficar sem o meu rendimento mínimo e você só se preocupa com o seu ao dia 21.

Vendo as lágrimas nos olhos de uma delas, peço-lhes que se acalmem e que esperem que eu vou já. A gestora das senhas olha para mim furibunda:
- Quem é a senhora?
- Uma cidadã.
- E vem para quê?
- Para me inscrever.
- Mas para si há senha.
- Sim, mas já agora dê-me o livrinho amarelo para estas senhoras apresentarem uma reclamação.
- E o que é que a senhora tem que ver com isso?
- O livro…
Dá-me a senha, vejo o número (252 – a contagem vai no 89) e vamos em busca do livro. Tenho muito tempo. Ninguém nos dá o livro; a culpa não é deles, é das pessoas que deixam tudo para a última da hora.

- Vão dar-me o livro ou vou ter que ir chamar o Sr. Agente?

Acabam por mo dar e abro o guichet para as minhas duas lesadas. Ainda não tinha terminado a 1ª, aparece mais um cliente.
- Trabalha aqui? É que eu estou aqui desde manhã e ainda…
Sorrio.
- Não, já terminei, mas depois deixo-lhe o livro.

Pergunto, sempre a sorrir, como se chegou àquele estado caótico; já sou quase da casa. “Antes havia dois turnos, até às 20h. Agora como decidiram que fechava às 16h30, só há um. Não podemos fazer milagres e muitos ficam até às 18h. O Ministro é que havia de vir aqui, mas como um qualquer, sem motorista…”

Passa-me rapidamente a vontade de ir à casa de banho só de olhar lá para dentro. Olho de esguelha para os números que ainda não chegaram às centenas e vou apanhar ar, não vá apanhar antes uma doença qualquer.

- … mas não sabe o seu código postal? É 1000 e qualquer coisa, 2000 e picos?

Gritos e mais gritos.

Regresso, sento-me nas escadas e fecho os olhos. Os cheiros, os traços vincados daquelas pessoas, os olhares tristes, as crianças ramelosas, as mães precoces. Sinto o chão a fugir-me e não consigo parar as lágrimas… Venham buscar-me, isto vai alagar.

Assisti em directo a mais um episódio da lenta implosão do Estado Providência em Portugal.