dezembro 28, 2005

Caixa negra

Não descansam enquanto não as encontram e, uma vez encontradas, parecem não servir para nada. Nunca ouvi um único relatório sobre o seu conteúdo. Começo mesmo a desconfiar que não passam de mais uma daquelas invenções humanas que só servem para desangustiar, para nos dar a sensação de que tudo é controlável.

Numa noite mal dormida, sonhei com caixas negras lançadas ao mar, caixas negras que encerravam tudo o que nunca consegui dizer sobre a injusta justiça dos homens, sobre arguidos e presumíveis inocentes, providências cautelares, recusas de juízes, prisões preventivas, prazos, recursos, mais prazos, e mais recursos. Com a mediatização de processos judiciais, um homem transforma-se, malgré lui, em perito destas coisas.

Recordo-me de ter escrito numa dessas caixas negras, como que para justificar a ausência de palavras quando o silêncio era atitude proibida. Do que escrevi pouco me lembro, a não ser da confiança depositada em quatro paredes para que transmitissem ao verdadeiro destinatário as palavras que enfim libertei sem receios.